Quarta-feira, 28/10/2015. 18:10
O engenheiro brilha. O engenheiro
cintila. O engenheiro refulge. O engenheiro não cabe em si e grita antes do
Galamba se introduzir, com um sorriso de orelha a orelha, na sala:
– Viste, João? Viste, pá?! Enrabei o
pasquim à força toda!
O Galamba, que se sorrisse mais chegava
com o canto da boca ao piercing que lhe fura a fossa escafoide do pavilhão
auricular esquerdo com intuitos decorativos, entra na sala com os braços
levantados, pára, ajoelha-se no chão e, de braços esticados, genuflecte várias
vezes em frente ao engenheiro.
O engenheiro ri à gargalhada e levanta-se
a bater palmas.
O Galamba sem parar de genuflectir ergue-se
e o engenheiro abraça-o e trocam vigorosas palmadas nas costas.
– Tenho me lembrado muito daquilo que
pusemos no projecto do programa do partido – diz o engenheiro, subitamente
sério, agarrando-o pelos ombros.
O Galamba olha-o embevecido mas
inquiridor e o engenheiro recita:
– “A aparência da susceptibilidade dos
detentores de cargos públicos e interesses alheios às funções que desempenham
tem contribuído para minar a confiança dos cidadãos nas instituições.”
O Galamba recupera o sorriso.
O engenheiro pisca-lhe o olho e recomeça
num tom panfletário:
– E o Partido Socialista promete tudo
fazer para implementar e instituir – faz uma pausa e acabam os dois em coro: –
“A garantia de protecção e defesa do titular de cargos políticos ou públicos
contra a utilização abusiva de meios judiciais e de mecanismos de
responsabilização como forma de pressão ou condicionamento.”
– Hum… – arrulha o Galamba. – Desresponsabilizem-me!
O engenheiro dá uma gargalhada. O Galamba
rejubila:
– Está-se tudo a encaminhar, Zé. Tudo!
– Sabes o que decidi, João?
O Galamba abana a cabeça.
– Quando isto acabar e mesmo que não seja
preciso chegarmos onde tínhamos falado…
– À amnistia?
O engenheiro anui com a cabeça e
continua:
– Ou às alterações na lei…
– Nas leis.
– Nas leis. Mesmo que não seja preciso
chegar a nada disso…
– Se isto continuar assim vai ser muito
mais fácil do que pensávamos.
– Sim, mas mesmo assim. Seja como for decidi que vou
tatuar um pequeno vinte e nove barra quatro ou um quarenta e quatro. – O
Galamba olha-o com admiração. O engenheiro conclui: – Ainda não decidi é onde.
– Eu tatuava um 44 – diz o Galamba. – Tem
mais impacto.
– O 29/4 é mais misterioso.
– É da Constituição, Zé.
– Sim, mas se tu não disseres ninguém
pensa nisso, não achas?
– 29
barra 4 in fine.
– In
fine!
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